quarta-feira, 27 de agosto de 2014



RUMO À PRESIDÊNCIA!
Crescemos num Município do Pará cujo acesso era feito só através de barco, àquela estação de nossa infância.
Acará era praticamente uma aldeia naquele modelo dos tempos do Brasil colônia em que a igreja católica era construída de modo a ter controle do povoado todo. Assim, todo o resto do município crescia em torno da igreja. Localizado às margens do rio que emprestava seu nome para o município, Acará ficava a mais de duzentos quilômetros da capital paraense.
Nos dias de então, não havia na cidadezinha grandes recursos quer fossem na área de saúde, de educação ou de transporte.
Meus pais, à época, eram funcionários do DER (Departamento de Estradas de Rodagem) órgão do Estado. Papai era Residente que configurava um cargo de chefia e mamãe, Enfermeira.
O município tinha uma caçamba do DER, um caminhão da prefeitura e o Jippe da Igreja que contava com um pároco de nacionalidade italiana muito trabalhador e querido da população: Padre Alberto.
O DER juntamente com a prefeitura municipal eram os únicos órgãos empregadores da cidade e mamãe, que era funcionária do DER, acabava por atender o município inteiro nas questões de saúde que surgiam e lá ocorria de tudo. Dessa forma, meus pais tornaram-se parte das autoridades constituídas na cidade que eram o padre, o prefeito, o delegado, seu Chico da DER (como os caboclos o chamavam) e dona Lindinaura, a enfermeira. Por esse motivo era comum ver nossa casa sempre muito movimentada. Dificilmente sentávamos à mesa sozinhos, principalmente aos domingos, quando papai mandava ou ia pessoalmente à colônia buscar o caboclo que vinha à cidade para trocar mercadoria, casar, batizar ou cuidar da saúde. Ao contrário da dinâmica da cidade grande, domingo no município de Acará era dia de muito, muito trabalho mesmo.
Nesse ambiente crescemos aprendendo desde aí a considerar e acolher com muita educação doméstica, principalmente, todo ser humano independente de sexo, credo ou cor. Era a nossa realidade: atender à porta, servir água e localizar o papai onde quer que ele estivesse no município.
Os anos passaram. Viemos para a capital estudar.
Em Belém constituímos família, vieram os filhos nossos, os netos do Chico da DER e da enfermeira Lindinaura.
Era comum visitar a cidade de Acará. No período dos estudos, fazíamos isso todo final de semana.
O município pouco mudava e, essa dinâmica de meus pais, parecia nunca ter fim. Continuava aquela população, agora muito maior, recorrendo a eles para diversas soluções.
Certa feita, Inês, a segunda filha dos cinco rebentos do casal, foi passar um fim de semana com a sua primogênita Juliana. A criatura contava uns cinco anos, cheia de vida, linda que só ela, muito engraçada e atenta a tudo. Juliana, vez por outra, se saía com cada uma e, por conta de suas conclusões, nos colocava em situações embaraçosas.
Estava a mana Inês descansando depois do almoço, se aninhando para aquela tradicional sesta paraense, quando bateram à porta. Acará não tinha mendigo, nem ladrão e a cadeia era praticamente um enfeite. Pois bem, Inês pede à Juliana que vá atender a porta e ela, cheia de energia, fagueira, levanta-se e saltitante vai.
— Escuta pequena, o seu Chico está?
— Não senhor, o prefeito saiu!— informa Juliana com propriedade e segurança. A mãe pula da cama vai ao encontro dela e explica:
— Minha filha, o vovô não é o prefeito da cidade, entendeu?
— Não!
— Mas ele não é Juliana, tá bom?
— Ah! Ele não é o prefeito?
— Isso mesmo! O vovô não é o prefeito!
— Tá bom! — e tornam à cama para merecido repouso. Quando já estão agasalhadas, novamente batem à porta e Inês, mais uma vez requere auxílio da nossa menina e Juliana faceira vai atender à porta.
— Seu Chico está?
— Não senhor, o Governador saiu!

                 


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